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Baku

Jibaku-kun: Twelve World Story (ジバクくん, na grafia original, e Bucky, na tradução estadunidense) é uma história em quadrinhos de autoria de Shibata Ami (1967-) publicada originalmente de maio de 1998 a dezembro de 2000 na revista Famitsu Bros. e, entre outubro de 1998 e fevereiro de 2001, em uma edição encadernada em seis volumes. Também recebeu uma adaptação para série de animação com vinte e seis episódios exibida originalmente entre outubro de 1999 e março de 2000, além de um volume especial, Jibaku-kun: Twelve World Story – 4 Koma Battle!!, publicado em julho de 2000 contendo histórias de diferentes autores.

A narrativa se passa no Kanzenkai (Mundo Completo): Twelve World, um continente formado por doze países dispostos conforme os números de um relógio. Esse mundo é habitado por dois tipos de população. O primeiro são as pessoas, que incluem humanos, animais antropomórficos e seres com formas híbridas entre humanos e animais. Já os segundo grupo são os Monsters, criaturas selvagens das mais variadas que vivem na natureza. Entre os Monsters, existem grupos como os Drive Monsters, monstros domesticados que vivem com as pessoas e servem de meio de transporte, bem como os Trouble Monsters (Monstros Problemáticos/Encrenqueiros/Inconvenientes), monstro que, por motivos desconhecidos, são acometidos por uma loucura agressiva e tornam-se violentos atacando qualquer um que encontrem. Existem ainda os Devil Monsters, monstros de alto nível de poder, inteligentes e capazes de se comunicar por fala.

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Kanzenkai: Twelve World

Para lidar com os Trouble Monsters, cada país conta com um Great Child (Grande Criança) — GC —, um cargo comumente desempenhado por um jovem cuja função é derrotar os Trouble Monsters que atacam a população. Cada Great Child possui um Great Watch (Grande Relógio), um relógio que serve como distintivo de seu cargo, bem como para receber informações sobre Trouble Goals — locais em que Trouble Monsters foram avistados indicados pela população através de telefonemas para um número de emergência —, acessar registros sobre os Monsters conhecidos e se comunicar com as GC dos outros países. Ainda, cada uma das doze GC conta com um seirei (Espírito Sagrado), uma criatura viva de forma esférica e cor rosada que tem a capacidade de explodir quando abre suas mãos.

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os doze seirei

A história se inicia quando Baku (cuja grafia em kanji é “爆”, cuja possível tradução seria “Estouro”), um garoto que vive no país que ocupa a posição da primeira hora no continente, o Mundo do 1: Fasta, e cujo sonho é um dia governar o mundo, resolve não fazer a ligação de emergência ao ser atacado por um Trouble Monster e é coincidentemente salvo por En (炎, “chama”), a Great Child de Fasta. En é conhecido por ser o maior e mais poderoso GC que já existira, mas, sem motivo aparente, decide abandonar a atividade e entrega para Baku seu Great Wacth e seu seirei Jibaku (um trocadilho com a palavra “autodestruição”, comum aos demais serei que também possuem nomes a partir de diferentes termos para estouro e explosão).

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Mundo do 3: Thaa

Baku decide tornar-se o maior e mais poderoso GC que já existiu para provar para En que tem potencial de se tornar o governante do mundo. Baku acaba sendo procurado por Pink — a GC do Mundo do 2: Secan — com sua seirei Bambi e Kai — o GC do Mundo do 3: Thaa — com seu seirei Bakuzan. Os três protagonistas vivem à sombra de En: Pink era portadora de uma doença mortal na infância e foi curada por En, enquanto Kai teve sua vila devastada por um Trouble Monster que só foi derrotado pela intervenção de En, e ambos se inspiraram nele para tornarem-se GC. Já Baku jamais desejou ser uma GC e aceitou o cargo para provar ser capaz, mas é sempre tratado como sendo o “sucessor de En” e avaliado a partir de comparações ao seu antecessor e nunca por seu mérito próprio.

Baku descobre através de seus colegas que todo aspirante a GC precisa de uma license, um título que reconhece a pessoa portadora como especialista em uma área ou prática específica, bem como possuir uma técnica especial, e que as license são concedidas após um teste realizado na Torre do Ponteiro existente no Mundo do 0, localizado no centro do continente e só possível de acesso após uma peregrinação pelos doze países até o Mundo do 12: Twell. Pink possui sua license em Poderes Psíquicos, e Kai, em Artes Marciais. Assim, o primeiro ato da HQ se desenvolve com o trio de protagonistas viajando em direção ao Mundo do 12: Twell, com Baku determinado a obter sua license e superar En, e Pink e Kai na expectativa de reencontrar seu herói, enquanto passam por cidades pitorescas resolvendo pequenos casos envolvendo Trouble Monsters. No caminho, no Mundo do 3: Thaa, Baku passa pelo treinamento com o mestre de Kai, Funen no Sennin, e desenvolve a técnica Kiwame (“Visão Elevada” ou “Olho Polarizado”), que permite enxergar o ponto fraco dos adversários. Além de passar pelo Mundo do 4: Fos e o Mundo do 5: Goi auxiliando suas respectivas GC, d’Artagnan, portador da license Esgrima, e Ali Baba, portador da license Roubo. Esse primeiro ato, em que os personagens viajam por diferentes países resolvendo pequenos conflitos e confrontando os mais hábeis e renomados de cada região lembra muito a estrutura do videogame Pocket MonstersPokémon na tradução estadunidense — de 1996 da Nintendo no qual Shibata claramente se inspirou, não só na estrutura narrativa como na temática do mundo estranho a ser explorado onde monstros variados ocupam o lugar que seriam dos animais selvagens e domésticos.

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Baku e Pink no Mundo do 5: Goi
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Ali Baba vs. Devil Monster Kamemond
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Pink vs. Silva
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Baku vs. Silva

Entretanto o ponto de virada se dá quando Pink é convocada de volta ao Mundo do 2: Secan, e os personagens acabam confrontando a avó de Pink, a ex-GC do Mundo do 2: Secan, Silva, que acredita que a neta ainda não completou seu treinamento. Ao impor a Pink um teste de suas habilidades, Silva toma posse de seu Great Wacth e, ao usá-lo, rejuvenesce até a aparência e forma física que tivera aos quatorze anos se mostrando muito mais poderosa do que os protagonistas. É revelado que Silva fora uma Great Soldier (Grande Soldado) — GS —, título conferido aos mais poderosos GC do  Kanzenkai: Twelve World ao torná-los agentes vinculados ao Mundo do 0 e receberem da Torre do Ponteiro a juventude eterna. Entretanto a transformação de Silva acaba alertando Hyou (雹, “granizo” em oposição a En), um GS tão poderoso quanto En e encarregado de administrar a Torre do Ponteiro e todas as GC. Hyou vai até o Mundo do 2: Secan para matar Silva por sua atuação não autorizada. Segundo Hyou, Silva havia abandonado o cargo como GS, e seu direito à juventude eterna, para viver com o homem que amava. Por tal atitude, como vingança por renegar a honra de ser uma GS, Hyou lançou sobre Silva uma maldição da Torre do Ponteiro que faria com que todas as pessoas que ela amasse contraíssem uma doença sem cura e morressem. Tal doença foi a causa da morte do avô de da mãe de Pink e era a doença que ela havia contraído na infância. Diferente do que Pink acreditava, En não a curara, mas usara uma técnica para transferir sua doença para Silva, que sofria do mal em segredo e, por isto, tivera seu poder drasticamente reduzido tornando-se inferior a Hyou.

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Hyou vs. Silva

Os protagonistas conseguem sobreviver ao ataque de Hyou, apesar de derrotados, e a partir de então mudam seus objetivos. Decidem viajar até a Torre do Ponteiro não apenas para que Baku possa passar pelo teste e obter sua license, mas também para obrigar Hyou e retirar a maldição de Silva antes que ela morra. O confronto com Hyou causa algumas alterações na trama. Primeiro, fica ainda mais óbvia a facilidade que Baku já havia demonstrado ao aprender o Kiwame com Funen no Sennin quando consegue, após apenas algumas observações, duplicar a técnica especial de Silva e provocar um pequeno ferimento em Hyou. Outro é que Hyou decreta que Baku, Pink e Kai passem a ser considerado Trouble Kids (Garotos Problemáticos) — TK —, um status concedido a humanos tão agressivos e perigosos quanto os Trouble Monsters e a qual é dever de todas as GC do Kanzenkai: Twelve World deter ou destruir. Assim, para chegar ao Mundo do 0 e à Torre do Ponteiro, os protagonistas, além da jornada, precisariam superar os GC do demais países que passam a vê-los como criminosos procurados e extremamente perigosos. E, apesar de Hyou fazer o possível para atrapalhar Baku em sua jornada, ele passa a declarar estar apaixonado por Baku e contraditoriamente aguarda com ansiedade a chegada de seu inimigo à Torre do Ponteiro para tê-lo por perto.

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A Torre do Ponteiro
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Os GC recebem ordens para caçar os Trouble Kids.

Até o ponto do final do primeiro ato, a versão animada segue com fidelidade a narrativa original da HQ, a exceção de alguns episódios adicionais filler e de pequenas mudanças pontuais no enredo. E também o fato de que a narrativa da série animada é muito mais arrastada, alongando o desenvolvimento da história e perdendo muito da dinâmica rápida e nada cansativa da versão original. Entretanto, a partir do segundo ato, a série animada apresenta uma versão diferente dos acontecimentos, sendo um dos motivos a versão animada ter alcançado a narrativa da história em quadrinhos na época de sua exibição fazendo com que seus produtores não tivessem material original pronto para ser adaptado. Assim, a série animada apresentou as demais GC tendo como referência os designs de personagens e nomes criados por Shibata, mas os colocando em diferentes contextos e com uma história diferente da versão original da história em quadrinhos.

No Mundo do 6: Rock, os protagonistas encontram um pais que está eternamente em festa, bem como o seu GC, Live, portador da license Música. Live, que fala através de versos cantados, com seu seirei Buzz, é extremamente superior aos Trouble Kids e os domina com certa facilidade. Entretanto o Mundo do 6: Rock, por fazer barulho excessivo em incomodar Hyou,  também recebeu uma maldição da Torre do Ponteiro, fazendo com que, à noite, o país inteiro seja invertido de posição e transportado para a extremidade mais a oeste do continente, tornando-se o Mundo do 9: Nainai. Assim, à noite, todos os seus habitantes transformam-se em fantasmas sem corpos físicos, e o país, que durante o dia permanece em constante frenesi de festejos, torna-se um lugar de vazio e silêncio em uma eterna alternância entre os pathos de Eros e Thanatos, entre uma pulsão de aproveitar a vida de maneira exacerbada e sem limites e uma pulsão de retração ao vazio e morte. Ao passar pela metamorfose noturna, sua GC é dominado por uma segunda personalidade mais adequada ao contexto de do Mundo do 9: Nainai. Dessa forma, Live e Buzz transformam-se no GC Dead, com sua license em Feitiço de Maldição, e no seirei Jubaku (que é um trocadilho tanto para “Estouro Fantasma” como para “Feitiço de Maldição”).

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a Árvore do 0

O segundo ato também passa a narrar os acontecimentos desenrolados na Torre do Ponteiro no Mundo do 0, mostrando Hyou como administrador da Torre do Ponteiro e dos GC e apresentado Chara, uma estranha criatura que ostenta o título de Vigia da Árvore do 0 e que serve como uma espécie de intendente da Torre do Ponteiro a serviço de Hyou. Além disso, revela-se que En também se encontra na Torre do Ponteiro aguardando junto à Árvore do 0, uma grande árvore sagrada incrustada nas fundações da Torre do Ponteiro, aguardando o despertar da Princesa Adormecida, uma mulher que dorme em uma cápsula junto às raízes da Árvore do 0 e que, ocasionalmente, é vista por Baku em seus sonhos sem que saiba de quem se trata. En, apesar de acreditar que precisa manter sua vigília ao lado da Princesa Adormecida, observa o pregresso de Baku aguardando sua chegada à Torre do Ponteiro e constantemente trava debates com Hyou defendendo Baku com argumentos, mas nunca age de maneira direta para auxiliar seu sucessor. Há ainda na Torre do Ponteiro a presença de Utsurou, um GS que não demonstra muito interesse por nenhum dos acontecimentos ao seu redor, bem como parece não se importar em fazer qualquer avaliação moral das condutas de Hyou ou Chara.

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Baku entre Ranmaru e Jiraiya

Ao chegar no Mundo de 7: Sevun, um país com referências culturais inspiradas no Japão feudal, os protagonistas se deparam com o GC Ranmaru, portador da license em Ninjutsu, e o seirei Rekka, que prontamente os captura e os leva para a prisão acusados de serem TK. Ranmaru é não apenas o GC local como também o senhor feudal responsável por manter a lei e a segurança dos cidadãos. Enquanto isso, Hyou, para dificultar a jornada de Baku e seus companheiros, ordena a Chara que vá até o Mundo do 7: Sevun e crie um Trouble Monster de alto nível para causar problemas. Chara acaba escolhendo o gentil Drive Monster de Ranmaru, Jiraiya, e o transforma em um violento Trouble Monster que ataca a cidade e sua população, colocando Ranmaru em um dilema de, para cumprir sua função e arcar com suas responsabilidades como suserano e GC, deve destruir seu amigo. O capítulo referente ao Mundo do 7: Sevun tem dois principais pontos interessantes para a narrativa. O primeiro é a postura de Hyou que, apesar de ser um GS e responsável pela administração da Torre do Ponteiro e por toda a estrutura de agentes responsáveis por proteger a população do Kanzenkai: Twelve World dos ataques de Trouble Monsters, ordena a Chara, outro agente desta mesma estrutura burocrática, a criar um Trouble Monster de alto nível de poder unicamente para perseguir e perturbar Baku por tê-lo impedido de aplicar sua vingança contra Silva. Já o segundo ponto acontece quando Baku impede Ranmaru, que está constrangido moralmente a cumprir o papel que esperam dele em sua sociedade, de atacar e destruir Jiraiya. Quando questionado por sua obrigação como GC de enfrentar e destruir todos os Trouble Monters, Baku se nega a construir sua identidade a partir do cargo que ocupa e decide procurar outra forma de lidar com o violento Jiraiya que leve à salvação do outrora gentil Drive Monster e não à sua destruição. Como símbolo de sua rejeição aos abusos da Torre do Ponteiro, Baku destrói seu Great Watch, que é não só um instrumento, mas também o distintivo do cargo de GC. A situação só se resolve com a chegada de um estranho que se teleporta ao local e usa a técnica Jouka (“Brilho Purificador” ou “Flor Purificadora”) removendo a maldição de Jiraiya. Detalhe que o nome “Jiraiya” associado a uma narrativa com temática ninja e iconografia de um sapo é uma referência já tradicional ao conto folclórico Jiraiya Gouketsu Monogatari, que possui sua versão escrita mais antiga de 1806.

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a destruição do Great Watch
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Geki usa a técnica Jouka.

O estranho recém chegado se revela como Geki, que havia se tornado um GS há oitocentos anos, mas que, após quinhentos anos exercendo o cargo, recebeu uma maldição da Torre do Ponteiro por discordar de algumas decisões e, como Silva, recebeu uma maldição como punição. Geki então foi transformado na criatura conhecida como Funen no Sennin, voltando à forma humana apenas uma vez a cada cinquenta anos. Para entender a brincadeira que Shibata faz ao construir o personagem é preciso ter em mente algumas referências. No Japão existem detalhados sistemas de separação de lixo para melhor destinação e aproveitamento para reciclagem e descarte, sendo que cada cidade possui suas especificidades. Uma das categorias de separação de lixo é a “funen”, que significa “não incinerável”. Já o termo “sennin” significa em português “ermitão” ou “eremita”, sujeitos que decidem viver isolados da sociedade e aos quais se costuma projetar um imaginário de que sejam pessoas sábias ou santas. Tal conceito aparece em várias obras de histórias em quadrinhos shounen, como no caso do personagem Mutenroushi, de Dragon Ball, que é conhecido como Kame Sennin (Ermitão Tartaruga). Assim, “Funen no Sennin” significaria algo como “Ermitão do Lixo Não Incinerável”. A maldição da Torre do Ponteiro lançada sobre Geki o transformou em um tipo de lixo que não poder ser queimado como descarte nem reciclado, tendo de ficar pela eternidade em um pequeno cesto de lixo identificado pela placa “funen”.

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A Ilha dos Resíduos Não Incineráveis dos Sonhos
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a técnica Dai Bakushinha

Geki teleporta Baku, Pink e Kai como ele para a Ilha dos Resíduos Não Incineráveis dos Sonhos, uma ilha localizada fora do continente do Kanzenkai: Twelve World composta por lixo de destroços tecnológicos que supostamente caíram do céu após uma grande explosão que houvera séculos atrás antes da existência da Torre do Ponteiro. Na ilha, Geki explica que os Trouble Monsters são criaturas comuns que foram dominadas por uma praga bem como demonstra o funcionamento de sua técnica especial Jouka. Geki levou o grupo até a ilha para, diante do talento de Baku para assimilar técnicas diversas com facilidade, ele aprenda a utilizar o Jouka e possa empregar um método alternativo para lidar com os Trouble Monsters àquele proposto pela Torre do Ponteiro. Mas, antes disso, Baku precisa passar pelo teste do Ouroboros, confrontando a si próprio e sobrevivendo, para tornar-se um GS e obter o direito de entrar na Torre do Ponteiro para assim confrontar Hyou. Enquanto Baku passa pelo teste, Geki, Pink e Kai são atacados por Jeanne, a GC do Mundo do 11: Ilevus, portadora da license em Armamentos, acompanhada de seu seirei Coronel Dan e de seu Drive Monster. Outra das referências que Shibata usa é que o teste para tornar-se um GS ocorrida na Ilha dos Resíduos não Incineráveis dos Sonhos tem um conceito muito parecido com o do teste na qual um candidato a Jedi precisa passar na diegese da franquia Star Wars ao entrar em uma determinado ambiente preparado no qual deve confrontar a si próprio e seus medos. Ainda, ao fundo no cenário da Ilha dos Resíduos Não Incineráveis dos Sonhos, que foi formada pela queda de destroços de uma explosão no céu, há os restos do que intencionalmente lembram a Estrela da Morte.

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diante do Ouroboros
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Amano, a Princesa Adormecida

Após a experiência na Ilha dos Resíduos Não Incineráveis dos Sonhos, Pink e Kai decidem retornar ao Mundo do 3: Thaa para passarem por um treinamento com Funen no Sennin a fim de aumentarem seu poder. Baku vai até o Mundo do 8: Eidon, um país cuja cultura é baseada na Era das Grandes Navegações, onde encontra Ali Baba com pretensões de auxiliá-lo. Baku e Ali Baba são desafiados pela GC local e pirata, Lucy, portadora da license Gambling (Aposta), e seu seirei Bakuchi-kun. Lucy ataca Baku seguindo as ordens da Torre do Ponteiro para capturar ou destruir os Trouble Kids, mas seu confronto com o protagonista se dá de outra forma. Lucy desafia Baku e Ali Baba para uma batalha de card game no qual Hyou também toma parte remotamente através do sistema de comunicação da Torre do Ponteiro tendo Chara junto à mesa de jogo agindo conforme suas instruções. Todo o arco narrativo passado no Mundo do 8: Eidon é uma grande paródia a narrativas/jogos de card game, principalmente à história em quadrinhos Yu-Gi­-Oh, publicada originalmente de 1996 a 2004, de Takahashi Kazuki (1961-) em que questões sérias e mortais são decididas em batalhas de cartas valendo-se de estratégias e regras complexas representadas por monstros caricatos e às vezes ridículos.

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Baku vs. Lucy vs. Ali Baba vs. Chara & Hyou
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Hayate e Thunder

No Mundo do 10: Tenpa, Baku e Ali Baba recebem o reforço de Dead e são atacados pelo GC local que também age sob ordens da Torre do Ponteiro. Hayate é portador da license em Fuu Sui (“Vento e Água” ou ainda “Feng Shui”, a técnica de geomancia que permite a manipulação do vento, da chuva e das tempestades) e do seirei Thunder e é o último da raça dos Choujin (Homens Pássaro). O Mundo do 10: Tenpa é um país com a cultura baseada na dos indígenas da América do Norte e também o lugar mais atacado por Trouble Monsters, uma vez que existe lá uma caverna que é o principal ponto de surgimento de Trouble Monsters que a usam como passagem para a superfície. Após um primeiro confronto, Baku se oferece, na companhia de Ali Baba e Dead, para acompanharem Hayate em uma missão até o interior da caverna para que ela possa ser purificada. Nas profundezas, Baku e Hayate de deparam com as raízes da Árvore do 0, cuja estrutura principal fica na Torre do Ponteiro e onde está localizada a Princesa Adormecida protegida por En. Lá eles têm de confrontar o fato de que é o contato com as substâncias expelidas pelas raízes da Árvore do 0 que transforma as criaturas normais em Trouble Monsters, bem como o fato de Chara saber desta verdade e manipular as raízes da árvore para matá-los.

O ataque às raízes resulta no despertar da Princesa Adormecida, e as raízes da Árvore do 0 passam a atacar intensamente toda a população do Kanzenkai: Twelve World e a transformar incontáveis criaturas em Trouble Monsters. O que faz com que todos os GC fiquem ocupados com suas atividades, e Baku siga sozinho para o Mundo do 11: Ilevus, uma cidadela de alta tecnologia mantida por uma força militar liderada por Jeanne e sua capacidade de criar armas de fogo e explosivas a partir da manipulação psíquica do próprio corpo.

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o ataque das raízes da Árvore do 0
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o Mundo do 12: Twell

No Mundo do 12: Twell, um país completamente submerso em um mar congelado, Baku e Geki confrontam Utsurou que, além de ser o primeiro indivíduo a conquistar o título de GS, é o GC local, acompanhado de seu seirei Jibaku Oh (“Rei da Autodestruição”). Apesar de ter sido amigo de Geki no passado, Utsurou é uma pessoa incapaz de expressar emoções e indiferente a quase tudo o que acontece no Kanzenkai: Twelve World, simplesmente seguindo a burocracia da Torre do Ponteiro sem nenhuma percepção crítica de suas ordens ou normas.

Ao finalmente adentrar na Torre do Ponteiro, na qual a Princesa Adormecida que lhe chama nos sonhos aguarda, o objetivo de Baku é destruir a Árvore do 0, ao redor da qual a Torre do Ponteiro está estruturada, para acabar com a maldição dos Trouble Monsters. Mas primeiramente precisa confrontar o GS que a administra, Hyou, e seu guardião, Chara.

A partir do segundo ato da narrativa, em que o objetivo dos protagonistas passa a ser chegar à Torre do Ponteiro para enfrentar Hyou e acabar com a maldição da Torre do Ponteiro lançada sobre Silva, a HQ deixa de ter como foco central uma aventura inspirada em videogames de RPG e caça de monstros e passa a tratar de abusos perpetrados na administração de uma instituição por seus dirigentes. A motivação de Hyou para lançar sobre Silva o que chama de “maldição da Torre do Ponteiro” é exclusivamente puni-la por rejeitar sua oferta de se juntar a ele na condição de GS. A maldição não partiu da Torre do Ponteiro como instituição e decorrente de suas normas internas, mas sim exclusivamente da vontade de Hyou motivado por seus sentimentos de ciúmes e rejeição. Hyou comete um abuso do poder que possui como administrador da Torre do Ponteiro e o mascara dando uma aparência institucional a todos os seus atos administrativos abusivos. O mesmo ocorre quando Hyou classifica Baku, Pink e Kai como Trouble Kids unicamente por o desafiarem ao se oporem ao ato de abuso institucional. Assim, Hyou coloca todo um aparato burocrático que envolve a Torre do Ponteiro, o Vigia da Árvore do 0, os GS e os GC contra Baku e seus companheiros, fazendo com que se desviem de sua função principal, combater os Trouble Monsters e proteger a população, motivado por uma ambição pessoal e não possuindo nenhum outro dispositivo de fiscalização institucional hierarquicamente superior ao qual tenha de prestar contas de seus atos como administrador da Torre do Ponteiro. O auge de seus desvios de conduta está quando, sendo um GS e líder da aparato organizacional responsável por deter os Trouble Monsters, ordena a Chara que intencionalmente crie novos Trouble Monsters ainda mais poderosos exclusivamente para que atrapalhem Baku e sem se importar com as consequências do que isto possa causar à população local ou aos Monsters amaldiçoados. Quando confrontado, Hyou rememora seu passado em que perdeu o que lhe era mais importante ao estar servindo à Torre do Ponteiro e como destruiu as demais coisas que lhe eram caras para não passar novamente pela dor da perda. Hyou cortou qualquer relação com sua vida como sujeito autônomo fora da Torre do Ponteiro acreditando nela absolutamente como mecanismo para lidar com suas perdas e justificando que elas ocorreram por um bem maior. A fé dogmática e inabalável de Hyou na Torre do Ponteiro permaneceu quando ele se tornou o responsável por sua administração e o levou a uma crença distorcida que confunde sua própria pessoa com a instituição e transfere para seus atos a presunção de verdade absoluta que possuía em relação à Torre do Ponteiro.

Assim, o segundo ato da narrativa leva os protagonistas, aliados e até mesmo alguns de seus oponentes, que se tornaram GC e GS com o objetivo de proteger o Kanzenkai: Twelve World, perceberam-se perpetrando a vontade de uma organização corrompida que tem a maior parte dos recursos consumidos para realizar objetivos pessoais de seus líderes. Mais do que isso, a estrutura que mantém o poder da Torre do Ponteiro em funcionamento com seu objetivo de proteger a população dos Trouble Monster é justamente o que provoca a transformação dos Monsters dóceis do Kanzenkai: Twelve World em Trouble Monsters. Ou seja, há todo uma sistema complexo em atividade cujo objetivo de existência é resolver os efeitos nocivos criados pela existência deste sistema. Um remédio tomado com a finalidade de curar os efeitos colaterais provocados pelo mesmo remédio. Mas a crítica de Shibata se torna ainda mais intensa.

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os Great Child

No terceiro ato, Baku encontra a Princesa Adormecida, Amano (天, “céu”), que lhe aguardava para fazer um pedido: que ele mate En. Séculos atrás, uma nave espacial chegou a Kanzenkai: Twelve World vinda de um planeta destruído pela guerra trazendo entre sua tripulação de refugiados Amano, En e Utsurou. Após a chegada, tal embarcação tornou-se Torre do Ponteiro. Entre os refugiados que partiram do seu mundo natal estava Shin, admirado pelo jovem En e que se sacrificou para que seus companheiros escapassem com vida. Entretanto, após a chegada ao Kanzenkai: Tewlve World, En desejou tornar-se tão forte quando seu herói fora e, para isto, pretendia iniciar uma guerra pela dominação do mundo ao qual recém chegara. Amano, sua irmã mais velha, lacrou-se com En na Árvore do 0 para impedi-lo de realizar suas ambições contra um mundo sem defesas. Entretanto En despertou primeiro e manteve sua irmã aprisionada. Ele utilizou a Árvore do 0 para criar uma zona de tempo estático no Mundo do 0 que o mantivesse eternamente jovem e transformar as criaturas dóceis do Kanzenkai: Twelve World em Trouble Monters. Assim, para lidar com a ameaça que ele próprio havia produzido, En criou todo o sistema de proteção do continente na forma dos GC e GS e lhes cedeu os doze seirei, sendo que estas criaturas estavam programadas para gravar e transmitir para a Torre do Ponteiro os dados e técnicas de seus usuários. En esperava estimular várias gerações de GC a se empenharem a tornarem-se mais fortes durante séculos para que pudesse assimilar suas habilidades e técnicas tornando-se o mais poderoso guerreiro que já existiu e portador da license Infinito. A Torre do Ponteiro e todo seu corpo burocrático e agentes, incluindo eventuais desvios de função e abusos de poder, tinha como único objetivo completar o plano de En para obter poder pessoal. En criara uma instituição que ameaçava o continente e ao mesmo tempo tentava protegê-lo gerando instabilidade e violência porque o estado de eterno conflito motivava em seus agentes um ímpeto de busca por poder que poderia tomar para si ao longo dos séculos. Dessa forma, não se trata de salvar a Torre do Ponteiro de uma elite que se apoderou de sua estrutura e passou a usá-la para alcançar objetivos pessoais, mas a própria existência da estrutura permite a existência e tem como finalidade o benefício de um pequeno grupo de sujeitos. En valeu-se ainda dos benefícios oferecidos pela estrutura que criara para assumir a imagem de herói idealizado e desfrutar de uma reputação inquestionável e ainda revela o papel que reservara para Baku em seu plano.

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Baku vs. En

Quanto aos desenhos, Shibata usa formas angulosas e com proporções um tanto caricatas para representar os personagens, e seus cenários remetem ao imaginário dos videogames de RPG dos anos 1980 e 1990. Seu estilo de representação de rostos de personagens com vários ângulos pontiagudos vem de uma tradição visual comum nas histórias em quadrinhos shounen dos anos 1990. Seus monstros também têm uma forte influência dos designs tanto do videogames Pocket Monsters como dos designs dos monstros feitos por Toriyama Akira (1955-) para a série de videogames Dragon Quest da Enix. Shibata é ainda muito imaginativa para criar cidades pitorescas e países baseados em culturas de contextos históricos e geográficos variados. O ponto mais interessante em suas ilustrações são as composições de cenas e enquadramentos e os designs de páginas, que constroem uma narrativa dinâmica e cheia de movimento, justamente o oposto do ritmo lento e quebrado da versão da adaptação animada. Vale lembrar que Shibata é uma autora mulher produzindo uma história em quadrinhos shounen, uma demografia que geralmente é mercadologicamente voltada para o público masculino e que não dá tantas oportunidades para autoras femininas. Todas as tradições formais dos quadrinhos japoneses convencionadas como estereótipo masculino, como as cenas de ação e ritmo rápido, são executadas por Shibata de forma hábil e eficiente. Com o avançar dos capítulos, ela passa a criar cada vez cenas de movimento com composições mais elaboradas e usos mais complexos de retículas. Apesar da história conter algumas cenas de confrontos, eles se resolvem e maneira rápida, tratando-se mais de conflitos de ordem ideológica e moral do que propriamente físicos. Não há longas cenas de luta que se estendem por muitas páginas, a história em quadrinhos de Shibata fica mais próxima do gênero de aventura do que de um battle shounen.

Shibata vale-se ainda do esquema usado por Toriyama de nomear personagens de determinados agrupamentos culturais ou étnicos a partir de temas. No caso de Jibaku-kun: Twelve World Story, a autora, por exemplo, usa jogos de palavras para nomear os seirei com trocadilhos de palavras relacionadas a conceitos de estouros e explosões. Bem como En, Hyou e Amano têm nomes derivados de elementos naturais. Ou ainda a família de Pink, cujos nomes são derivados de palavras para diferentes cores.

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Otoku Matsuri Manga Jibaku-kun

No final do volume 2 há ainda um capítulo especial intitulado Otoko Matsuri Manga Jibaku-kun, sendo “otoko matsuri” (“festival para homens”) um expressão usada para eventos como shows destinados exclusivamente para o público masculino ou de competições entre homens. Nesse capítulo é narrada uma história passada em um universo diegético alternativo com personagens masculinos. O protagonista é um homem musculoso que trabalha como operário de obras e resolve provar sua coragem destruindo uma enorme rocha que bloqueou a estrada após uma avalanche. Para isso, ele decide valer-se de seus companheiros seirei. Entretanto, nessa versão alternativa, os seirei morrem após usarem seus poderes explosivos. Esse capítulo especial trata-se de uma grande paródia aos clichês e exageros das histórias em quadrinhos “masculinas”.

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Jibaku-kun: Twelve World Story – 4 Koma Battle!!, 2000

Jibaku-kun: Twelve World Story – 4 Koma Battle!! é uma edição especial lançada na mesma época do volume 5 da edição encadernada da série principal contendo uma série de tiras cômicas em formato de quatro quadros com os personagens da série e com roteiros e desenhos de autores convidados. Participaram da publicação Ichi, Sugawara Kuniyuki, Oh-i Tomomi, Nosaka Naoki, Sakaki Bara & Kaoru Naoko, Hirorin, Mutsuringo e  Saku Marina. A publicação traz ainda os designs de personagens e monstro feitos para a série animada.

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tira de Nosaka Naoki
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designs para a série animada

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Crítica em vídeo:
“Jibaku-kun: Twelve World Story” de Shibata Ami, abuso de poder e corrupção institucional

Referências

MEDIA MIX. Jibaku-kun: twelve world story – 4 koma battle!!. Bros. Comics. Toukyou: Enterbrain, 8 de julho de 2000.

SHIBATA Ami. Jibaku-kun: twelve world story. Bros. Comics. Vol. 1-6. Toukyou: Enterbrain, 1998-2001.

Um comentário em ““Jibaku-kun: Twelve World Story” (“Bucky”), A Crise na Torre do Ponteiro e A Crítica às Instituições

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